Ato 06
Localidade: Você chegou a uma pequena cidade. Encontro: Dividiu um quarto com um
possível Aliado. Cativar. Dialogar. É
um idealista. Esqueleto no Armário: Tragédia
parecida.
A ronin chegou à pequena Oshika ao
final da tardinha. Deixou o velho guarda-chuva que encontrou na estrada aos
cuidados de um ancião que consertava guarda-chuvas. Voltaria no dia seguinte
para pega-lo. Comeu alguma coisa num quiosque e procurou uma estalagem. As
estalagens estavam lotadas: haveria um festival em honra ao deus da montanha e
as pessoas se acercavam da cidade para participar do dito festival.
Por fim apareceu um quarto, ou quase,
ela e outra mulher solicitaram o ultimo quarto de uma estalagem ao mesmo tempo.
Michi tinha certeza que solicitou primeiro, mas a mulher era irredutível. A
ronin não ia abrir mão do quarto e os ânimos começaram a se exaltar. Michi
levou a mão ao cabo da wakizashi e a mulher puxou uma marreta de ferreiro.
- Senhoras! – o estalajadeiro
interferiu – Não há necessidade disso! Porque não dividem o quarto? Afinal é um
quarto espaçoso com espaço para dois futons.
Elas entreolharam-se. A sugestão do
estalajadeiro fazia sentido e Michi preferia descansar do que lutar por um
quarto. A outra mulher parecia ter a mesma opinião da ronin. Nenhuma delas
queria voltar para a rua atrás de um quarto.
- Eu ofereço uma garrafa de saque
grátis!
- Aceitamos – as duas aceitaram ao
mesmo tempo.
E logo as duas estavam instaladas,
dividindo o saque. Conforme o efeito da bebida afogueava suas bochechas toda e
qualquer animosidade esvaiu-se e conversavam como se sempre tivessem se
conhecido.
- Sou Fumiko Kajiya – a mulher se
apresentou.
Fumiko era uma boa pessoa de palavras
sinceras e apreciadora do bom saque. Seus braços eram torneados, robustos,
fruto do trabalho de ferreira. Michi esperava não ser esmagada pelo abraço
daqueles braços. O trabalho de ferreira lhe deu um corpo forte, rijo e robusto,
mas não era uma mulher masculinizada. Fumiko tinha um ar um tanto quanto
andrógeno.
- Sou Michi Shokunin!
- A artesã que ajudou o curandeiro de
Isumi? Aquele remédio salvou muitas vidas.
- Minha ajuda foi pouca, o mérito é
todo de Yoshiro e de sua aprendiz, e não sou mais uma artesã...
- Brindamos a isso! – a ferreira
interrompeu a ronin enchendo novamente o copo de ambas.
Enquanto Fumiko debruçava-se para
encher o copo de Michi seu quimono abriu e o cordão que trazia uma kurosu caiu
para fora. A ronin olhou para a cruz por uns segundos. Fumiko reagiu
rapidamente escondendo o cordão e se afastando.
- Sim! – disse olhando para as espadas
de Michi – Sou uma kirishitan!
Vai me denunciar? Vai me executar! Do mesmo jeito que executaram minha família?!
O pai de Michi havia lhe contado sobre aqueles
que haviam abraçado uma religião ocidental com um deus pregado numa cruz. Michi
sabia que a religião fora proibida nas ilhas, mas ainda haviam muitos kakure
kirishitan. Havia poucos anos vinte e seis deles haviam sido mortos porque se
recusaram a renegar sua fé.
A ronin também sabia que havia uma ordem do
shogun ordenando a morte de todo kirishitan que fosse encontrado por um samurai.
A resolução nos olhos de Fumiko lhe dizia que ela seguiria o mesmo caminho
daqueles: preferindo morrer a renegar sua fé. A artesã não entendia tamanho
idealismo, mas admirava sua lealdade e sua honra.
- Deixe de bobagem! – ela disse – Tudo isso
por causa de um pingente bonito? Me sirva mais saque!
A ordem existia e era destinada a todo
samurai, mas ela não era um samurai, era apenas uma humilde ex-artesã que se
tornou uma ronin.
- Kanpai! – brindaram juntas mais um copo de
saque.
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